Carta Aberta - David Williams

Carta Aberta aos Estudantes de Ashtanga Yoga
David Williams
Tradução: Fábio Furtado


Toda vez que eu viajo para diferentes partes do mundo ensinando Yoga, sempre me vêm à mente certos conceitos fundamentais sobre como ensinar e praticar Ashtanga Yoga, baseados em estudo e observação pessoais e nos meus 32 anos de prática ininterrupta. Penso serem importantes o suficiente para querer compartilhá-los com todos.

Primeiro, o mais importante de tudo – e espero que você possa aprender isso na sua prática: “Se dói, você está fazendo errado”. Ao longo dos anos, tenho visto gente demais se machucando e machucando outros. A prática de Yoga pode ser (e deveria ser) prazerosa do início ao fim. O que importa de fato é mulabandha e uma respiração profunda e completa. Com isso e por meio da prática diária, a obtenção de mais flexibilidade é inevitável.

Aprendi a partir da minha própria prática e observação que forçar as limitações que você tem em determinado momento para conseguir entrar em uma postura pode fazer com que você se machuque, e a conseqüência, no mínimo, será a necessidade de parar para que a lesão se recupere e então retomar a prática. Tal seqüência de eventos não é apenas desagradável, mas contrária à minha convicção de que, por meio de uma prática lenta, estável e diária, pode-se conquistar uma flexibilidade ainda maior – resultado da ação de nosso próprio calor interno, que nos faz relaxar nas posturas, em vez de forçar-nos nelas. Percebi que esse método mais lento, além de ser mais saudável e permitir o desenvolvimento de uma flexibilidade maior, faz com que ela seja de natureza mais duradoura do que a flexibilidade obtida quando se força uma postura. Infelizmente, como muitos acabam descobrindo, forçar nossas limitações pode trazer como resultado atividades reduzidas ou limitadas durante a recuperação. Esse ciclo pode produzir associações desagradáveis com a prática, em vez das experiências agradáveis que eu procuro apresentar e que me parecem ser necessárias para quem quer uma prática para toda a vida.

Penso ser importante mostrar às pessoas como elas podem fazer das séries do Ashtanga Yoga não só uma prática para toda a vida como também uma experiência absolutamente prazerosa. Imagino que, quando você viu a prática pela primeira vez, deve ter dito para você mesmo: “Se eu conseguir fazer isso, vai ser o máximo!”. Pois aí está: você já observou bastante a prática e quer continuar com ela. A chave então é se tornar apto a praticar Yoga pelo resto da sua vida. Depois de mais de 30 anos observando milhares de pessoas praticando Yoga, percebi que os que perduram são aqueles que sabem como tornar a prática algo de que possam desfrutar. Eles pensam na sua prática diária de tal maneira que nada pode impedi-los de achar um tempo para fazê-la. Ela se torna uma das partes mais prazerosas do seu dia. Os outros, consciente, subconsciente ou inconscientemente, desistem de praticar. E o meu objetivo, toda vez que encontro e dou aulas a novos alunos, é fazer tudo o que estiver ao meu alcance para inspirá-los a construir e estabelecer sua prática de Yoga não apenas durante os poucos dias em que estamos juntos, mas para o resto de suas vidas.

Em segundo lugar, espero que você possa entender que o principal objetivo do Yoga não é aumentar a flexibilidade ou a força. Uma maior flexibilidade e força são simplesmente resultados e benefícios naturais da prática diária. E, embora flexibilidade e força sejam benefícios importantes e visíveis do Yoga, acredito que a principal finalidade da prática do Yoga é a auto-realização e a capacidade de manter-se a si mesmo em equilíbrio e saudável todos os dias. A saúde é o seu maior bem. O DNA do corpo sabe o que é bom e saudável para o organismo; tudo o que ele precisa é de energia. A prática energizante e rejuvenescedora do Yoga pode ser a fonte.

Por último, vez ou outra me perguntam se alguém é “bom no Yoga”. Eu prontamente respondo que o melhor Yogin não é o mais flexível, mas o que está mais focado naquilo que ele ou ela estão fazendo e o que mais intensamente consegue realizar mulabandha e uma respiração profunda. É com certa tristeza que vejo pessoas “competindo na prática de Yoga” e também os que acabam desencorajados quando percebem tal competição e pensam que jamais serão capazes de fazer a sua prática com a flexibilidade e a destreza dos que estão mais avançados nas séries. O maior Yogin é o que consegue aproveitar a sua prática de Yoga ao máximo, e não aquele que é capaz de dar um nó cada vez mais complicado em si mesmo. Estou convicto de que, na prática dessa meditação em movimento que é o Ashtanga Yoga, o que realmente importa é o que está invisível ao observador, ou seja, aquilo que se passa dentro do praticante.

Eu acredito no Yoga. Acredito que qualquer um que queira pode praticar o Ashtanga, mesmo que com modificações que ajustem a prática à sua pessoa, de maneira que seja de fato prazerosa. Faz anos que costumo repetir: “Se alguém me diz: ‘Você tem 15 minutos, uma hora, etc., para fazer alguma coisa boa para você mesmo, então vá pescar, andar de bicicleta ou qualquer coisa assim’, eu começo imediatamente a fazer as Saudações ao Sol do Ashtanga Yoga e a Primeira Série”. Se alguém conseguir me mostrar algo melhor, estou pronto a aprender. Em meus 30 anos de busca, estudei cinco ou seis sistemas de prática do Yoga. E, para mim, não conheço nenhum programa de aptidão física, mental e emocional que seja melhor que o sistema do Ashtanga Yoga. Espero que você possa sentir o mesmo.

Seu no Yoga,
David Williams pratica Yoga desde 1971 e Ashtanga Vinyasa Yoga desde 1973, quando se tornou o primeiro não-indiano a aprender o sistema completo de asana e pranayama diretamente de Sri K. Pattabhi Jois em Mysore, Índia.

Respiração Ujjayi

Como tornar mais livre a Respiração Ujjayi
Artigo traduzido do Yoga Journal.
Tradução: Fábio Furtado



Meu professor disse que minha respiração Ujjayi é muito tensa. Tentei torná-la mais relaxada, mas não sei se estou fazendo direito.
— Heidi Palmqvist, Sófia, Bulgária

Tim Miller responde: Quando feita da maneira correta, a respiração Ujjayi (cuja tradução é “vitoriosa”) deve ser ao mesmo tempo energizadora e relaxante. Nos Yoga Sutras, Patañjali sugere que a respiração seja dirga (longa) e suksma (suave, macia). O som da Ujjayi é criado ao se contrair gentilmente a abertura da garganta, a fim de se produzir uma certa resistência à passagem do ar. No momento em que o ar é gentilmente puxado para dentro na inspiração e gentilmente empurrado para fora na expiração contra tal resistência, surge um som bem modulado e calmante – algo como o barulho das ondas do mar indo e vindo na beira da praia.

O cerne do seu problema pode ser algo tão simples quanto o esforço que você exerce para fazer Ujjayi. É importante lembrar que a chave para a respiração Ujjayi é relaxamento; a ação necessária para se fazer a Ujjayi é algo que naturalmente alonga a respiração. Um pequeno esforço é requerido para produzir um som agradável, mas esforço demais produz uma respiração sôfrega e um som irritante (um som que “raspa”). Geralmente, é a inspiração que representa um desafio maior. Por isso, comece praticando com a expiração, em que há um processo natural de deixar fluir.

Para treinar a inspiração, procure produzir um som suave e agradável, que seja sem pressa e sem esforço. Minha sugestão é trabalhar a sua respiração Ujjayi em uma posição sentada de pernas cruzadas que seja bem relaxada. Imagine que você está sorvendo o ar através de um canudo. Se a sucção é muito forte, o canudo colapsa e uma enorme força é necessária para sugar qualquer coisa através dele. Uma vez que a respiração Ujjayi tenha sido dominada em uma posição sentada, o desafio passa a ser manter a mesma qualidade de respiração em sua prática de asanas.

Na sua prática, procure manter a extensão e a maciez da respiração tanto quanto possível. Quando você tiver encontrado uma base para a sua respiração Ujjayi em uma postura que não exija tanto esforço (como Adho Mukha Svanasana, por exemplo), o objetivo passa a ser manter essa qualidade de respiração ao longo de toda a prática. Alguns asanas requerem bastante esforço, o que pode fazer com que você comece a tensionar a respiração. Se você sentir que está tensionando a sua respiração, pode ser que você esteja exigindo demais de você na sua prática. Use esse feedback como um termômetro para a prática – toda vez que você começar a tensionar demais, pode ser a hora de sair da postura e relaxar.

Tim Miller estuda Ashtanga Yoga há mais de vinte anos e foi o primeiro norte-americano certificado a ensinar por Pattabhi Jois, do Ashtanga Yoga Research Institute em Mysore, Índia. Tim possui um vasto conhecimento deste sistema ancestral, empregado por ele de maneira dinâmica e cuidadosa.